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Joaquim Evangelista: “O sucesso do Estágio mede-se pelo que conseguimos melhorar na vida das pessoas”

Joaquim Evangelista: “O sucesso do Estágio mede-se pelo que conseguimos melhorar na vida das pessoas”

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O Presidente do Sindicato de Jogadores fecha, com chave de ouro, uma sequência de reportagens e entrevistas feitas pelo Craques a propósito do impacto dos estágios dos Jogadores e Jogadoras para 2025/26. Joaquim Evangelista fala do percurso de uma equipa que trabalha desde 1972 e que criou uma iniciativa crucial em 2001 que já ajudou pessoal e profissionalmente vários jogadores e ex-jogadores.

CRAQUES – Olhemos para os primórdios do Sindicato há 23 anos, quando “andavam com a casa às costas”, como disse o José Carlos, e procuravam cedência de campos junto da Federação, e o percurso feito até às atuais instalações em Odivelas. Qual foi o momento ou decisão mais marcante nesta transformação?

JOAQUIM EVANGELISTA – De facto, desde a nossa fundação em 1972, o Estágio do Jogador, que nasceu em 2001, ainda no mandato presidido por António Carraça, é uma das iniciativas mais relevantes, porque cumpre uma missão que é simultaneamente de apoio à empregabilidade dos jogadores e de assistência social. Felizmente, temos contribuído positivamente para transformar muitas vidas. O caminho foi sendo feito com coragem e trabalho da nossa equipa e o sucesso deve-se a todos.

Olhando para trás, são muitas as histórias com a casa às costas e dedicação diária do Zé Carlos, do Rebelo, do Franque e de muitos treinadores que nos ajudaram nesta missão, procurando apoios para a cedência de campos e instalações com dignidade para receber futebolistas profissionais. O Campus do Jogador foi um projeto que traçámos a longo prazo, e felizmente a gestão financeira responsável que fizemos permitiu alcançar esse objetivo e criar uma infraestrutura própria, a casa de todos os futebolistas em Portugal, capaz de proporcionar as melhores condições para quem precisa do nosso apoio.

C – E que papel teve pessoalmente nesta evolução?

JE – Pessoalmente, só posso sentir-me orgulhoso por liderar as equipas que tornaram isto possível. Somos um caso único no contexto dos mais de 60 países que integram a FIFPRO.

C – Ao longo destes anos de estágios, quais considera serem os casos de maior sucesso? Há jogadores que passaram pelo Sindicato e que hoje são referências no futebol português? Como medem o verdadeiro impacto destes projetos na carreira dos atletas?

JE – O Estágio não se mede só pelos casos de sucesso desportivo. Mede-se, por exemplo, pelos participantes que não estudavam e começaram a fazê-lo depois de estarem connosco. Ou que começaram a demonstrar interesse por outros projetos, no caminho para a transição de carreira. Claro que temos histórias verdadeiramente inspiradoras, como a do Miguel Garcia que depois de ter estado connosco, após um momento menos bom na carreira e a recuperar de lesão, foi recrutado pelo Olhanense e, na mesma época, deu o salto para o SC Braga, onde integraria a equipa que jogou a final da Liga Europa.

Miguel Garcia (à direita) defrontou o FC Porto de Falcão na final da Liga Europa 2010/11

Temos também vários casos de jogadores que, fruto da boa preparação feita no Estágio, conseguiram fazer um excelente contrato, em Portugal ou no estrangeiro. Outros tornaram-se treinadores e vieram ao Estágio para crescer, mas, sobretudo, retribuir o que o futebol lhes deu e ajudar colegas de profissão, como o Nandinho, o Pedro Martins, o Silas ou, nesta edição, o Zé Pedro. São todos exemplos de que esta iniciativa é especial, mede-se por resultados na taxa de colocação, mas também, reforço, pela diferença que conseguimos fazer na vida das pessoas. Lembro-me do quão difícil foi para o Carlos Fernandes aceitar o fim de carreira, lidando inclusivamente com questões de saúde mental. Estivemos sempre ao lado dele e hoje temos homem, treinador de guarda-redes e empreendedor. Os indicadores de sucesso nunca serão apenas números.

“O estágio feminino pode cumprir uma dupla missão”

C – O José Carlos revelou-nos que “a par de Espanha, não há outro Sindicato com futebol feminino”. O que vos levou a dar este passo histórico com o primeiro Estágio da Jogadora? Foi uma decisão estratégica planeada ou surgiu de uma necessidade específica que identificaram?

JE – É verdade, embora outros sindicatos como França ou Inglaterra já tenham testado o apoio às jogadoras em ‘off season’, apenas os nossos companheiros da AFE em Espanha tinham até aqui um verdadeiro estágio focado na empregabilidade, à semelhança do que acontece para o masculino. Durante algum tempo, entendemos que o número reduzido de praticantes e a necessidade quase absoluta de recrutamento das mesmas pelos clubes, tornava desnecessária uma iniciativa para promover a procura ativa de clube.

Com o aumento do número de praticantes, mas também pela sensibilidade recolhida no terreno pela nossa equipa do futebol feminino, liderada pela Carla Couto, apoiada pela Micaela Matos no Norte e a Matilde Fidalgo, percebemos que fazia sentido lançar o projeto. Até porque não é só a componente desportiva que o Estágio acrescenta, a formação integral e a sensibilização para a importância de ter um plano B no futebol é transversal e muito importante para que o futebol feminino não passe pelos mesmos flagelos na transição de carreira. Sem dúvida que tomámos a decisão certa e estou muito orgulhoso daquilo que fizemos até aqui.

C – Tanto a treinadora Isabel Osório como vários participantes sugeriram que os estágios deveriam começar mais cedo, e alguns jogadores propuseram até estágios diferenciados por patamares (a nível de divisões onde jogam). Que ajustes estão a planear para as próximas edições? O Estágio da Jogadora vai continuar e expandir-se?

JE – A calendarização desta 1ª Edição foi um desafio por vários motivos. Por um lado não sabíamos de antemão se teríamos adesão e, por outro, o próprio calendário competitivo entre os diferentes escalões levantava dúvidas sobre o momento ideal para integrar jogadoras, após as suas férias. Iremos fazer esse balanço e refletir sobre o que podemos melhorar na próxima edição, mas acredito que o Estágio Feminino pode, de facto, cumprir uma dupla missão. A de dar condições de trabalho e preparação às jogadoras de elite, muito na lógica do que fazemos para o masculino, mas ao mesmo tempo promover a prática desportiva no feminino, fazer captações para alargar a base de praticantes e criar oportunidades para mulheres, muitas delas jovens, que ambicionam atingir esse patamar. Enquanto Sindicato queremos ser úteis à classe que representamos, as profissionais de futebol, mas também ao desenvolvimento do futebol português, que como sabemos, em especial no futebol feminino, precisa de mais praticantes.

“Temos um projeto para dar um envelhecimento saudável aos ex-jogadores”

C – Para além da componente desportiva, o Sindicato tem uma forte vertente social e educacional, com cursos de podologia, saúde mental, literacia financeira, línguas… Como vê esta dupla missão? É possível ser simultaneamente um sindicato de proteção laboral e uma instituição de formação integral?

JE – Não só é possível como é indispensável ter uma visão 360º dos problemas que afetam os jogadores, por estarem muitas vezes interligados com o sucesso ou insucesso na esfera laboral. Neste curto período em que os jogadores passam connosco queremos, pelo menos, sensibilizá-los para questões absolutamente essenciais no seu desenvolvimento enquanto pessoas e atletas, e felizmente o follow up que temos tido é excelente.

O tempo em que os jogadores eram vistos apenas como um instrumento dos clubes e que não podiam fazer mais nada durante a carreira além de jogar à bola acabou. Cada vez mais, têm consciência de que sem a educação, o empreendedorismo e o investimento neles próprios não conseguirão ter sucesso. E são muitas as famílias que já incutem esses valores desde a formação. Estou certo de que este trabalho do Sindicato e de outras instituições do futebol português na formação integral dos atletas colherá frutos, especialmente nas próximas gerações de dirigentes.

Esperamos que melhorem os mecanismos de licenciamento e controlo salarial. De forma a evitar mais casos de falências e queda de clubes históricos. E é necessário um maior escrutínio dos investidores no futebol português, nacionais e estrangeiros.

C – O Nuno Pina confessou-nos que “muitos jogadores têm preconceito de vir ao Sindicato” e que já ouviu dizer que “é só para largados”. Como combate estes preconceitos? E quais são os maiores desafios que enfrenta atualmente na gestão do Sindicato?

JE – Acredito que esse estigma se tem vindo a esbater, até pelas várias vertentes que oferecemos nesta iniciativa. Há jogadores que estão a treinar sozinhos ou no ginásio, quando têm disponível um espaço com condições profissionais e acompanhamento por uma equipa técnica altamente qualificada, à semelhança do trabalho que fazem nos clubes. É uma escolha que respeitamos. Isso não pode demover-nos de continuar a trabalhar e apoiar quem precisa da nossa ajuda. A quantidade de chamadas de agentes e clubes, em Portugal e no estrangeiro, que vamos recebendo é demonstrativa de que o estigma só está mesmo na cabeça das pessoas. Porque, como se costuma dizer, quem não aparece é esquecido. Num setor cada vez mais competitivo e profissionalizado, mesmo nas divisões inferiores os detalhes fazem a diferença, é preciso qualidade física, técnico-tática e muita resiliência mental para ser bem-sucedido. No Estágio do Jogador procuramos dar todas estas ferramentas.

Nuno Pina: "O Sindicato é uma porta para muita gente"
Nuno Pina: “O Sindicato é uma porta para muita gente”

C – Olhando para o futuro, qual é a sua grande ambição para o Sindicato dos Jogadores? Há novos projetos em mente? E como vê a evolução do futebol português nos próximos anos – que papel quer que o Sindicato desempenhe nessa transformação?

JE – Tenho vários projetos e ambições por concretizar no apoio aos jogadores e no desenvolvimento do futebol português. Melhorar condições laborais e combater a precariedade, desde logo com a aprovação do primeiro Acordo Coletivo de Trabalho para o futebol feminino. Contribuir para a solidariedade intergeracional, apoiando os ex-jogadores e contribuindo para um envelhecimento saudável.

Temos um projeto estrutural nesta área para lançar brevemente. Queremos melhorar a proteção social dos futebolistas através do Fundo de Pensões e da recuperação das garantias do estatuto legal de profissão de desgaste rápido. O SIndicato pretende ser um vetor de apoio à transição de carreira e empreendedorismo, sensibilizando o setor do desporto e o mercado de trabalho, em geral, para as mais valias na contratação de atletas. São precisos mais programas de incentivos.

Queremos ainda reforçar a lusofonia, criar mecanismos de cooperação e reforçar o talento português no mundo. Quanto ao futebol português em si mesmo, o processo de centralização dos direitos televisivos promete impactar toda a indústria e enquanto representantes dos jogadores acompanharemos essa “revolução” que é esperada. Esperamos que melhorem os mecanismos de licenciamento e controlo salarial. De forma a evitar mais casos de falências e queda de clubes históricos. E é necessário um maior escrutínio dos investidores no futebol português, nacionais e estrangeiros. Quer ao nível da idoneidade e conflitos de interesses, quer ao nível das garantias financeiras que prestam para a sustentabilidade dos clubes. O Sindicato trabalhará sempre em prol do diálogo social e da concertação, sem deixar de defender, intransigentemente, os interesses da classe que representa.

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